A Modernidade Líquida de Bauman


Este texto é uma breve síntese e reflexão das ideias da obra “Modernidade Líquida”, do sociólogo polonês Zygmunt Bauman, mais especificamente do Prefácio (Ser Leve e Líquido) e do Capítulo III (Tempo/Espaço), que traz algumas metáforas para nos fazer refletir sobre a sociedade ao longo dos tempos e sobre o status da modernidade.

No prefácio da obra, Bauman inicia falando sobre a fluidez ou liquidez, como uma metáfora para o estágio presente da era moderna, que capta a natureza nova na era da modernidade e nos faz refletir sobre as consequências que essa transformação social está trazendo para as relações entre as pessoas e para a vida em geral. Derreter os sólidos significa eliminar o que se considera irrelevante na era da racionalidade e levar aos avanços progressivos na economia de seus embaraços políticos, éticos e culturais. A solidez das instituições sociais (a família, o governo, as relações de trabalho, etc.) está perdendo espaço para o fenômeno de liquefação. De acordo com essa metáfora, a solidez dessas instituições, firmes e inabaláveis, estão se derretendo, transformando-se, irreversivelmente, num estado líquido que tem como característica principal a capacidade de moldar-se em relação as mais diversas estruturas. Neste tempo de transformações no relacionamento humano, os laços afetivos e sociais acabam se tornando o centro da questão e a liquefação dessas antes solidas instituições evidenciam um tempo de desapego e uma suposta sensação ilusória e provisória de liberdade que, na verdade, traz consigo um desapego social em que nós nos encontramos. 

Na era da modernidade líquida o que está em jogo não é a conquista do novo território, mas a destruição das muralhas que impediam o fluxo dos novos e fluidos poderes globais e a capacidade de moldar-se em relação a infinitas estruturas e estes são algumas das características que o estado liquefeito conferirá às tantas esferas dos relacionamentos humanos, o que provoca a desintegração da rede social cada vez mais móvel, escorregadio, evasivo e fugitivo, sendo isso, um resultado e uma condição da nova técnica do poder, que pretendem uma contínua e crescente fluidez, como principal  força e garantia de sua invencibilidade.

No capítulo 3 (tempo/espaço) da obra, Bauman nos faz refletir sobre o modo de vida em comunidade, iniciando a partir da descrição de um espaço definida por suas fronteiras vigiadas de perto, para controlar a entrada de pessoas estranhas, compartimentando espaços públicos com acesso seletivo, em que a separação no lugar da vida em comum é a principal dimensão da evolução corrente da vida urbana. Para refletir sobre isso, o autor traz a definição de Richard Sennett, sobre a cidade que é um assentamento humano em que os estranhos têm a chance de se encontrar e que nesse momento não há espaço para aprendizagens a partir dos erros ou expectativas de outras oportunidades. Usar uma máscara é a essência da civilidade, pois permitem a sociabilidade pura diante das circunstâncias do poder, do mal-estar, dos sentimentos privados das pessoas, etc. Devendo ser a civilidade uma característica da situação social no meio urbano, propício à prática individual da civilidade. 

As categorias de espaços públicos mas não civis são trazidas a reflexão pelo autor quando destaca que a primeira delas se refere aos monumentos pomposos construídos e as praças imponentes atuais, porque são inacessíveis, reforçando-se e complementando-se mutuamente. Já a segunda categoria se destina a servir aos consumidores, sendo o consumo, o passatempo absoluto que só podem ser sentidos subjetivamente. 

Bauman escreve sobre a  relação humana a partir da ideia de alteridade. Para isso, vai buscar no antropólogo Claude Lévi-Strauss (Tristes Trópicos) dois conceitos: antropoêmicas e antropofágicas. Sendo que o primeiro visa a aniquilação ou exílio dos outros e o segundo a suspensão ou aniquilação de sua alteridade. Em continuação a essa reflexão, o autor fala sobre os lugares êmicos (separação espacial, acesso seletivo para o impedimento ao contato físico, ao diálogo e a interação social, visando o exílio e a aniquilação dos outros.), lugares fágicos (desalienação, suspensão e aniquilação de sua alteridade, são as cruzadas culturais, as guerras, os cultos, etc.) Os não-lugares (são espaços destituídos de expressões simbólicas de identidade, relações e histórias, são os aeroportos, auto-estrada, hotéis, etc.) e os espaços vazios (são os lugares não colonizados e excluídos dentro da cidade). 

Os espaços “públicos-não-civis” mantêm a pose irrelevante e desnecessária para a prática da arte do viver urbano. Esses espaços permitem que lavemos nossas mãos de qualquer intercâmbio com estranhos a nossa volta, evitando a comunicação e as relações sociais. O não fale com estranhos tornou-se o preceito estratégico da normalidade adulta, reafirmando como regra de prudência a realidade de uma vida em que os estranhos são pessoas com quem nos recusemos a falar. 

Nas reflexões sobre o tempo e espaço, Bauman traz a história do tempo, que para ele começou com a modernidade, a emancipação do tempo em relação ao espaço, sua subordinação à inventividade e à capacidade técnica humana, a colocação do tempo contra o espaço como ferramenta da conquista do espaço, isso veio significar a aceleração do movimento como meio de ampliar o espaço, passando da modernidade pesada a modernidade leve.

A modernidade pesada, na era dos Hardware se refere a era tradicionalmente instrumental, o tempo era o meio que precisava ser administrado prudentemente para que o espaço pudesse ser maximizado e a moderindade leve na era dos Software, é a era da eficácia do tempo como meio de alcançar valor no campo dos objetivos potenciais.  A moderindade pesada mantinha o capital e o trabalho, já a modernidade leve permitiu a saída de um deles, demonstrando uma evolução política e econômica do trabalho e do capital que estavam juntas, ficando o capital contemporâneo livre da mão-de-obra humana. Sendo isso hoje a principal base da dominação e o principal fator das divisões sociais, em que se vive o jogo da competição, da fusão e da redução de tamanhos.

Na modernidade sólida a duração eterna é o principal motivo e princípio da ação, a modernidade fluida não tem função para a duração eterna. O curto prazo substitui o longo prazo. A nova instantaneidade do tempo muda o convívio humano e o modo como os humanos cuidam de seus afazeres coletivos e o modo como se transformam certas questões em questões coletivas. A escolha da era da instantaneidade significa buscar a gratificação evitando as consequências e particularmente as responsabilidades que elas podem implicar na vida humana.

A modernidade líquida que adentra nas famílias, na escola e na vida em sociedade de uma maneira geral nos faz ver que somos o molde do que as mudanças ocorridas ao longo dos tempos, bem como os valores atuais nos proporcionaram. Ser professor nessa nova era significa inserir-se nesse contexto e enfrentar os desafios ao qual está sujeito, quer seja de forma passiva ou ao menos reflexiva quanto a esse novo modelo de sociedade construído.

BAUMAN, Zygmunt. Modernidade líquida. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2001 (Prefácio e capítulo 3).

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